António Maio em entrevista ao jornal Diário Insular 16.05.2018

António Maio, líder da CEMAH: "Economia açoriana está mais competitiva"

 

A Caixa Económica da Misericórdia de Angra do Heroísmo apresenta, em relação a 2017, um resultado líquido de exercício de 1,2 milhões de euros. Qual o significado desse resultado, tendo presentes a dimensão da instituição e as atuais condições de mercado?

R.: Os resultados de 2017 foram bastante satisfatórios e representam a confiança dos clientes na Instituição, para além de serem reveladores de um esforço continuo da CEMAH na obtenção de bons resultados e na manutenção de uma gestão sã e prudente. O resultado líquido foi de 1.265.761€, mas o rendimento gerado foi de 4,1M€, sendo que o rácio de capital se situou nos 13,14%, indicador confortável face ao que é exigido.

Destaca-se o aumento do volume da carteira de depósitos em 5,71% e do crédito concedido em 2,32%, num total de depósitos de clientes no valor de 374.096.412€ e um total de crédito concedido bruto de 215.357.966€.

É ainda de salientar que a quota de mercado da CEMAH, a nível regional, nos depósitos é de cerca de 15,5% e no crédito é de cerca de 6.6%. Se analisarmos em particular a realidade da ilha Terceira, onde temos uma maior rede comercial e uma maior tradição e penetração no mercado (122 anos de existência), a CEMAH detém uma quota de mercado nos depósitos de 50.5% e no crédito de 19.30%, indicadores muito positivos do nosso desempenho, na tradição secular de bem servir e exercendo a banca de proximidade como componente core da sua missão e atividade.

Como refere, o resultado obtido ganha uma importância acrescida tendo em conta que a CEMAH está inserida num mercado altamente competitivo, onde concorre com instituições de dimensão internacional, e em que algumas delas no passado recente registaram aumentos de capital significativos por forma a poderem satisfazer as regras impostas pelo regulador, às quais a nossa instituição também está sujeita, e que com esforço e resiliência tem conseguido cumprir, tendo sempre contado com a imprescindível compreensão dos seus órgãos sociais e os da sua entidade titular, a SCMAH, com destaque para a posição do provedor, sempre alinhado com os objetivos estratégicos da instituição.

É também de ter em conta as atuais condições de mercado, que se por um lado assistimos ao impacto positivo da retoma económica, onde se destaca a evolução registada no setor do turismo, por outro lado o atual contexto de taxas de mercado, motivado pela política monetária seguida pelo Banco Central Europeu, tem contribuído para um esmagamento da atividade de intermediação financeira. A avaliar pelos resultados dos últimos anos, não tem sido fácil a atividade bancária em Portugal, mas a CEMAH posicionou-se como Instituição de referência, bastante sólida, atenta aos desafios da era digital e cumprindo cabalmente com o exigente quadro regulatório do sector.

Como nota menos positiva, o facto de ainda não ter sido possível a almejada e justa distribuição de dividendos à SCMAH, os quais ficaram retidos para justamente reforçar os fundos próprios e assim permitir o cumprimento integral dos rácios de capital. Contudo, temos fundadas esperanças de que, provavelmente já relativamente ao exercício corrente, conseguiremos retomar uma normal politica de dividendos.

 

A carteira de depósitos cresce mais do que o crédito concedido. A Caixa não poderia melhorar o seu apoio à economia neste particular?

R.: A importância de uma Instituição Financeira no apoio à economia não se mede apenas pelo crédito concedido, mas igualmente pela poupança captada.

O facto de a carteira de depósitos ser superior à de crédito tem uma longa tradição na CEMAH e traduz, precisamente, o apoio dado aos agentes aforradores açorianos, - preocupação que esteve sempre na génese desta instituição - considerando que oferece aos seus depositantes taxas de remuneração de depósitos competitivas, face à média do mercado. Tradicionalmente a CEMAH é uma instituição depositária, o que revela a confiança que os nossos clientes têm em nós.

A economia social faz parte da nossa identidade e nesse sentido pretendemos alguma prática diferenciada, como, por exemplo a da isenção da comissão de manutenção de conta, sem dúvida uma das comissões de mais difícil aceitação pelos clientes e cuja aplicação está generalizada no sector.

A par disto, a CEMAH pretende apoiar o investimento produtivo e responder às necessidades de financiamento dos seus clientes, verificando-se nos últimos anos um aumento gradual da carteira de crédito concedido, em especial em atividades correlacionadas com o turismo.

É também de destacar a nossa  preocupação na concessão de  crédito a IPSS, associações culturais, recreativas, desportivas e outras instituições da mesma génese, que são o cerne da economia social da região, mas sem nunca descurar o rigor pelas estratégias e politicas da instituição, no cumprimento das melhores práticas de mercado e de acordo com as orientações do Regulador, bem como uma adequada ponderação do fator risco associado à concessão de crédito.

Temos a perfeita consciência de que somos um pilar importantíssimo no financiamento da economia regional, estabelecendo linhas de negocio com todos os agentes económicos ativos na RAA, privilegiando a economia social e a parceria estratégica que mantemos com o sector publico, sem duvida, fulcrais para a viabilidade da própria instituição.

Gostaria de salientar, uma vez mais, que o apoio à economia não é feito apenas na conceção de crédito às famílias e empresas, mas também por via da remuneração dos depósitos dos clientes, onde a CEMAH desempenha claramente um papel de destaque.

 

Ao nível da satisfação global, a Caixa está no pódio (terceiro lugar) num inquérito realizado pela Deco Proteste. Qual a importância destes inquéritos na vida de uma instituição financeira?

R.: Diria que isto se reveste de uma enorme importância para a imagem da instituição.

É estimulante e prestigiante que uma instituição pequena como a nossa ocupe, no panorama nacional bancário, um honroso terceiro lugar. Isto é fruto também do cariz social que imprimimos nas políticas, estratégias e modelo de negócio que implementamos na CEMAH. Não procuramos o lucro fácil e temos das comissões mais baixas do mercado. Só não conseguimos melhor posição porque temos os efeitos dos custos de escala relacionados com a nossa dimensão. Recentemente, num inquérito do género, a nossa plataforma de canais online mereceu igualmente grande aceitação, o que  indicia que os nossos  clientes estão satisfeitos com a plataforma.

Um dos fatores que claramente nos distingue é a proximidade ao cliente que sempre fez parte do nosso modelo de negócio, o que nos permite, por um lado, conhecer bem os nossos clientes, adaptando os nossos produtos e serviços às suas necessidades e, por outro lado, ter um contacto constante com o cliente e um tempo de decisão rápido comparado com o que se passa no setor. É preciso ouvir o cliente e criar produtos e serviços que sejam do seu agrado. É isso que temos vindo a fazer com ponderação e até alguma criatividade face aos recursos limitados, obviamente sempre no estrito cumprimento de todo o quadro normativo que nos regula.

 

A Caixa é desde este ano de 2018 membro de pleno direito da Associação Portuguesa de Bancos. Como foi possível chegar lá e que benefícios para a instituição resultam desta integração?

R.: A CEMAH congratula-se pela ascensão, no presente ano, a membro de pleno direito de tão prestigiada Associação quanto a Associação Portuguesa de Bancos (APB).

O processo de adesão, que há muito almejara, ganhou novos e significativos contornos no passado ano de 2017, com a submissão de pedido de admissão, ao abrigo do disposto nos Estatutos desta mesma Associação.

Por essa mesma ocasião se expressava que, não obstante os cerca de 121 anos que detinha como instituição, a CEMAH tem caminhado a passos largos no sentido da evolução e transformação, de forma a responder prontamente aos novos e muitas vezes conturbados desafios de enquadramento regulatório que se impõe.

Com efeito, por força da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 190/2015, de 10 de setembro, a CEMAH foi objeto de transformação em caixa económica bancária (antes, era caixa económica anexa), podendo, nessa mesma condição, praticar as mesmas operações que aos bancos são permitidas, o que terá sido decisivo para a sua admissão, dado que a APB apenas integra bancos.

A integração da CEMAH como membro associado da APB representa, pois, para a nossa Instituição, precisamente, mais um passo que incrementa no sentido do vanguardismo económico-financeiro e da preparação adequada para o cumprimento do exigente processo regulatório.

Destarte, atento o exigente e inevitável processo de transformação em sociedade anónima etapa que se segue a curtíssimo prazo e que devera estar concluída ainda este ano, por via da determinação do regulador, alias, prevista no referido diploma) e também devido ao denso e complexo processo legislativo por que tem passado a banca portuguesa em geral, a possibilidade de estar devidamente representada e ser tecnicamente coadjuvada por uma Associação com a expertise, prestígio e know-how da APB, principal entidade representativa do sector bancário a nível nacional, revela-se, para a CEMAH, como um fator assaz importante e benéfico.

Temos vindo a assistir nos últimos anos a um autêntico “tsunami legislativo “, pelo que a recente adesão à APB vai-nos facilitar a assimilação e implementação de todo este complexo e exigente quadro regulatório.

 

À luz do contexto do qual a Caixa é parte, como analisa o comportamento atual da economia açoriana?

R.: A economia açoriana tem vindo a evoluir positivamente nos últimos anos, tornando-se muito mais competitiva, com elevado nível de abertura, com uma matriz intersectorial mais dinâmica e já com uma razoável dose de diversificação.

Os tempos da “monocultura da vaca” já lá vão (não obstante o peso deste sector como pilar da nossa economia, ainda em 2017, com novo recorde da produção de leite), hoje assistimos a uma forte dinâmica do sector terciário, onde o turismo tem vindo a registar crescente importância estrutural.

De acordo com dados do Serviço Regional de Estatística dos Açores (SREA) o Indicador de Atividade Económica, a dezembro de 2017, apresentou o valor de 2,1%, o 6º mês consecutivo acima dos 2%, representando um aumento em relação a dezembro de 2016, em que apresentava o valor de 1.7%. Apesar disso, a região continua a debater-se com o desafio do desemprego, que se situava nos 8.3% no final do ano transato, e que ficava acima da média nacional no mesmo período (8.1%), não obstante ter vindo a regredir a um ritmo bastante acelerado.

Com a liberalização do espaço aéreo regional tem-se registado um incremento significativo no turismo, que muito tem contribuído para a dinamização da atividade económica da região. Em 2017, tivemos 2 384 678 dormidas (um aumento de 20.6% face a 2016), um número de camas de 10228 (aumento de 18.8%) e 1 563 155 passageiros desembarcados nos aeroportos (incremento de 18,5%), dados que seriam completamente impensáveis há relativamente poucos anos e que nos permitem considerar este sector como um importante polo de desenvolvimento regional.

Resumindo, é com satisfação que vejo a economia açoriana a ter bons resultados, claramente numa fase de expansão do ciclo económico, no entanto deverão ser desenvolvidos esforços no sentido da diversificação económica, nomeadamente no setor produtivo de bens transacionáveis de alto valor acrescentado (de forma  a atenuar os custos inerentes a uma região insular) aproveitando os nossos recursos e potenciando as exportações uma vez que o mercado interno é limitado, não esquecendo que num futuro, mais ou menos próximo, os fundos europeus tenderão naturalmente a diminuir de valor, baixando assim a sua importância estrutural.

 

Disse numa entrevista ao DI em 2016 que a Caixa necessitaria de um plano estratégico no âmbito do mecenato cultural, tendo presentes as responsabilidades da instituição na nossa sociedade. Dois anos depois e tendo presentes os bons resultados tornados públicos, não será tempo de haver novidades?

R.: O que foi dito nessa entrevista esta a ser cumprido, embora com os condicionalismos do quadro regulatório e as naturais opções da gestão, sem esquecer que somos pertença integral da SCMAH, instituição que nos cumpre apoiar em primeira linha.

Se entendermos por mecenato cultural o apoio a iniciativas e eventos na área cultural, posso dizer-vos que são inúmeros os eventos que receberam o nosso apoio em toda a região, sempre na ótica de uma ajuda estratégica e com retorno de imagem, mas nunca como patrocinador exclusivo, pois a dimensão e natureza da CEMAH não o recomendaria.

Para além destes apoios pontuais, temos ainda uma forte presença no financiamento de diversos projetos no âmbito da economia social, sejam IPSS, sejam associações desportivas, recreativas e culturais, com uma singular presença de inclusão e compreensão pelas realidades especificas de cada instituição, intervindo em áreas onde a banca tradicional não se encontra sensibilizada e onde a nossa presença é fundamental.

Sem a CEMAH, a economia social na RAA não seria certamente a mesma.

 

 

 

In Diário Insular, 16 de maio de 2018, p. 2-3

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